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         Anri Sala é um artista jovem albanês que começou a trabalhar com vídeo ainda na graduação na Academia Nacional de Artes de Tirana. Na exposição "o momento presente" localizada no Instituto Moreira Salles, mescla em seus trabalhos a condição política do seu país com a expressão estética das obras, na forma de videoinstalações sonoras, principalmente, mas também fotografias, que muitas vezes se aproximam de pinturas e objetos.
          Os fatores som e arquitetura são constantes ao longo de toda a exposição, que conta com catorze trabalhos e um filme experimental de quarenta minutos exibido em determinados horários da semana. Cada um dos trabalhos é disposto pelo espaço numa organização bastante peculiar que faz com que os espectadores sigam um certo trajeto elaborado por Anri, a fim de que tenham uma experiência com a arquitetura e que com o choque do presente, baseado em influências do passado, e reflitam de forma crítica.
           "Le Clash", o sétimo trabalho exposto, talvez represente de forma mais contundente os entes arquitetura e som mencionados anteriormente. Produzido em 2010, conta com um vídeo HD em canal único, som surround 5.0, em uma sala de dimensão média. A estrutura brinca com o impacto sensorial dos telespectadores pela movimentação na sala, devido ao fato de haver uma tela posicionada na parte de trás da outra, exibindo vídeos diferentes com reproduções da música "Should I Stay or Should I Go", do grupo britânico representante da cultura punk rock do começo dos anos 1980, The Clash.
            Em um dos vídeos, um homem carrega uma caixa de música e um casal empurra um realejo em direção a uma casa de concertos fechada em Bordeaux, com o som da música ao fundo em alguns momentos; no outro, a faixa do The Clash é reproduzida em um instrumento musical muito antigo por diversas pessoas. Essa dupla opção de visualização tem o objetivo de causar nos observadores o deslocamento de um lado para o outro, a escolha de um dos lados, a alternância, o "ou". A música também se relaciona com esse fator, por apresentar duas opções em seu título e letra, e isso também justifica sua escolha  da mesma pelo artista.
            Muitas interpretações podem ser obtidas pelo espectador. Acerca da música representante de uma cultura e momento histórico, além da sua alta popularidade atualmente e também sobre a presença de instrumento antigo musical utilizado por muitas pessoas em um momento no qual já é considerado ultrapassado há muito tempo. Entretanto, sem dúvida, a arquitetura do trabalho e a presença de som permeando-o, entes que trabalham a percepção e movimentação dos observadores,  é o fator mais importante a ser observado e analisado no trabalho "Le Clash" de Anri Sala.

Para Anri Sala, fazer uma exibição é como começar uma conversa com o lugar e os futuros visitantes. Não é somente exibir bem cada trabalho, mas também exibir o espaço entre os trabalhos. Para haver comunicação não tem que haver necessariamente uma narração ou uma comunicação verbal. A música, por exemplo, tem uma crescente importância em seu trabalho, enquanto a linguagem propriamente dita está cada vez menos presente. Na obra “Answer me”, há uma jovem tentando terminar um relacionamento por razões não especificadas, e ao invés de ser ouvida, ela acaba constantemente silenciada pelo barulho da bateria que está sendo tocada por aquele que virá a ser seu ex-namorado (inclusive percebe-se que a última fala da jovem é “it’s over”, ou seja, está acabado). Do lado da sala em que a jovem se encontra, o batuque do rapaz (fisicamente do lado oposto) acaba muito próximo dela. Isso mostra a ideia de como um lugar, sem fazer muito, apenas estando lá, pode transformar um silêncio constrangedor em um barulho constrangedor. Isso ocorre porque a filmagem se passa em um local propício à amplificação sonora. De acordo com a curadora da exposição feita no Instituto Moreira Sales, Anri Sala desenvolve frequentemente trabalhos em locais com alguma carga histórica. No caso de Answer me, a filmagem foi feita no interior das cúpulas geodésicas da antiga estação de escuta e espionagem construída pela agência de segurança nacional dos Estados Unidos, em Berlim Ocidental a partir de 1963, para monitorar o antigo bloco soviético. É um conjunto de quatro cúpulas que hoje são uma ruína da guerra fria, e se encontra no topo da “Montanha do diabo”, uma colina formada pelo empilhamento de destroços da cidade na segunda guerra mundial. Além disso, ela se encontra sobre o projeto inacabado de uma faculdade militar nazista que os aliados não conseguiram destruir. Essas cúpulas amplificam extremamente os sons. Desse modo, houve comunicação, porém, não necessariamente verbal por completo. O próprio local historicamente conflituoso já se relaciona com o conflito do casal.
O filme “1395 days without red” se passa em Sarajevo, focando interseções na parte da cidade chamada “Sniper Alley” (beco dos atiradores) durante o cerco de forças sérvio-iugoslavas que começou em 1992, durando mais de 4 anos. Foi fruto de um desenvolvido por Šejla Kamerić e Anri Sala que visava um projeto único em conjunto com o maestro Ari Benjamin Meyers. O nome “1395 dias sem vermelho” vem do alerta do governo contra o uso de cores vivas, temendo ataques. Sarajevo fica nos Alpes Dinaric a 1.700 pés de altitude com picos próximos atingindo mais de 6.000 pés, proporcionando ampla elevação para localizar e pressionar os habitantes da cidade. No filme, a protagonista procura chegar na sala na qual ensaia a 6° de Tchaikovsky, ou “a Patética”. No caminho, ela atravessa os cruzamentos de Sniper Alley. Tal viagem não é cronologicamente linear, indo e voltando no tempo. A noção de tempo no filme não é passada através de diálogos (os quais são ausentes), e sim pela alternância entre cruzamentos e cenas de ensaio, de acordo com a ordem das partes da peça de Tchaikovsky sendo tocadas, passando a ideia de avançar ou regredir no tempo. Assim, cria-se uma reflexão sobre memória (no caso, traumática) e o ato de assumir a memória em si (como quando se aprende uma peça). Para Sala, o filme não é sobre contar uma história, e sim reviver uma experiência. É sobre como transmitir coisas sem fala-las. O único diálogo é entre a respiração e a sinfonia tocando. Mostra também como o corpo cria gestos, podendo produzir comunicação sem produzir um discurso verbal.
Anri Sala não se vê tornando necessariamente uma referência. Ele espera que seu trabalho crie dúvidas na audiência, enquanto há muitas certezas, ou que crie certezas quando houver muitas dúvidas.
A partir dessa exposição, podemos refletir melhor sobre arte contemporânea, chegando a pensar que talvez seja uma boa forma de desautomatizar o pensamento humano contemporâneo, que se encontra acostumado com informações diretas, preso em uma zona de conforto imposta por uma cultura que direciona o homem ao que deve ser compreendido de cada informação, sem margens a um pensamento crítico ou interpretativo.
Fontes:
Ceasefire Magazine
Anri Sala: music before language- Louisiana Channel
Anri Sala- No Names, No Title

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